Depois da Tempestade

Depois das grandes tempestades em nossas vidas, às vezes, ao invés da bonança esperada,
costumamos fechar a alma  para balanço.
 E por mais que digamos estar disponíveis e abertos ao diálogo, bem no fundo do nosso coração 
colocamos uma porta. 
E esta porta  fica tão trancada, que se nós mesmos não a abrirmos, torna-se-á quase que intransponível.
 É como se nossa casa tivesse sido saqueada e o  medo de que fosse arrombada de novo
não nos deixasse viver sossegados. 
Visitantes cadastrados até poderiam
chegar ao jardim...
mas passar da soleira, quem disse?
E ficamos tantas vezes nos perguntando, o porque de ninguém se aproximar muito  de nós se pensamos, numa atitude de bloqueio à verdade, que estamos dando espaço
para que todos nos visitem. 
Fingimos não enxergar  o letreiro luminoso de 
“passagem proibida” ou os cadeados enormes que colocamos nos portões e nos muros que erguemos ao redor de nós, porque é duro admitir que temos medo de  mais experiências depois que  uma, duas, três ou mil delas  não deram certo.
Mas se só as pessoas sensíveis  enxergam o nosso bloqueio e elas são cada vez em número menor, as não tão persistentes se afastam, com medo de que soltemos os cães bravos em cima delas 
e as ponhamos para correr. 

Assim acabamos, por comodismo, ficando    com as pessoas menos perigosas; com aquelas com quem sabemos que nunca chegaremos a ter envolvimento  maior, até porque sua percepção não é tão aguçada para penetrar no nosso interior. 
Ficamos com aquelas  com quem temos menos afinidades e pouca cumplicidade, principalmente aquela que vem do fundo da alma,  porque não queremos que ninguém invada a fortaleza inexpugnável    dos nossos segredos, onde guardamos as mágoas, os ódios não passados a limpo e os amores mal sucedidos.
Não queremos saber de quem nos leia os pensamentos e  não pretendemos nos prender a nada, embora digamos sempre o contrário e  saibamos que a falta de amarras num porto onde poderemos atracar quando estamos à deriva, pode constituir  uma bela teoria de liberdade, mas não nos gratifica, pois o ser humano 
não nasceu para ficar só.
Nos poucos dias em que Adão  esteve solitário,  o próprio Deus achou que ele precisava de uma companhia e criou Eva. Mas o casal,   embora tendo  suas brigas,  não teve a possibilidade de   escolha que nós temos. 
Um teria ao outro ou nada, pois não existia ninguém  além deles dois no recém-criado mundo.
Nós, bem ou mal,
podemos escolher os amores e os amigos. 
E que possamos escolher os melhores,
e não os mais cômodos.
E que possamos,  também , ter alguns  inimigos e, entre os nossos conhecidos,  pessoas incompatíveis  conosco, porque são eles que nos ajudam a superar os nossos limites e nos botam prá frente, nem que seja para que lhes mostremos do que e o quanto somos capazes.
Precisamos ter histórias prá contar,
sejam elas com finais tristes ou felizes. 
Precisamos passar por experiências que nem sempre são gratificantes pois uma existência 
passada em brancas nuvens,
é uma existência sem frutos.
Um dia, talvez, venhamos a entender  melhor os mistérios da vida e   que,  para chegarmos a um determinado ponto, muitas vezes teremos que  passar por vários obstáculos.
Talvez entendamos que precisamos
 nos purificar sofrendo várias  provações
 até conseguir nossos objetivos
e receber alguma recompensa.
Algumas doutrinas religiosas e filosóficas  tentam explicar  porque algumas pessoas  sofrem e outras são poupadas e porque alguns de nós  encontram suas metades e outros passem a vida a procurá-la. Mas são  explicações que  talvez nós,  leigos,não consigamos facilmente  entender. 
A única coisa que podemos arriscar,
é que nada acontece por acaso 
(ou será que acontece?).
Talvez,  quando sofremos, estejamos passando por um processo  de purificação  que nunca será entendido ou aceito por nós enquanto estivermos 
vivendo  a experiência. 
Talvez,  quando procuramos alguém ou alguma coisa, estejamos nos informando; talvez,  quando encontramos tanta gente incompatível conosco  é porque , de alguma maneira, somos ou fomos  as pessoas  determinadas a surgir em suas vidas, seja  para suportá-las, ajudá-las ou para que,  através delas, aprendamos  alguma lição importante: da serenidade à perseverança, 
da paciência à fé.
Mas, por mais que apanhemos, que nos escondamos para fugirmos da vida, de nós mesmos,  dos machucados e rejeições,tudo passa. 
O  desespero nunca foi solução para nada pois, afinal,  não há mal que sempre dure 
e nem bem que nunca acabe.
A vida sempre seguirá dando voltas . 
Tomara que saibamos aproveitar  as ascensões  para levantar quem estiver próximo de nós
e as quedas  para aprendermos a ser humildes.


(
Maria Eugênia - Doce Deleite)

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